Ideias fortes do texto de Pinto
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A AVALIAÇÃO EM EDUCAÇÃO: DA LINEARIDADE DOS USOS
À COMPLEXIDADE DAS PRÁTICAS
Jorge Pinto
Considero que o texto de Pinto é um excelente exercício de síntese e problematização em torno da clarificação da avaliação, tendo o seu foco, como o autor menciona, em 3 áreas: i) conceções de avaliação; ii) quadros concetuais, as 4 gerações de avaliação de avaliação, a que se associa uma 5ª, e iii) quadros concetuais e modelos pedagógicos.
As duas ideias fortes do texto que apresento não deixam de ser escolhas pessoais enquadradas sumariamente noutras ligações.
1ª Ideia – hegemonia da avaliação das aprendizagens, a força histórica da 1ª geração de avaliação polvilhada com suaves ideias de outras gerações
Através da revisão das gerações de avaliação (Guba e Lincoln, 1989), Pinto explicita que a natureza e funções da avaliação são produtos de um tempo histórico e é nessa medida que devem ser olhadas e compreendidas. As gerações de avaliação permitem percorrer a história da avaliação, entendendo-a como um processo em mutação enquadrada em contextos pedagógico-ideológicos bem específicos ditados pela evolução da sociedade, sistemas de ensino e suas relações com o mundo do trabalho e com a própria noção de cultura (p. 9).
A avaliação serve assim um determinado tempo da educação ao serviço do sistema de ensino dominante. Nas quatro gerações (medida; objetivos/descrição; julgamento e abordagem plural/negociação, a que outros autores juntam uma 5ª - social), o objetivo e papéis do professor e dos alunos são diferenciados.
Nesta longa marcha, a avaliação das aprendizagens tem sido (ainda é) dominante no processo educativo das escolas (portuguesas). Ela é a garantia do reconhecimento da posse da cultura, o instrumento e meio de certificar através de uma verificação/medição do que cada um sabe, ou melhor da determinação do lugar que cada um ocupa na hierarquia da posse desse saber, ou seja, da excelência escolar (p. 9).
A avaliação das aprendizagens mantém a função certificadora e de medida da avaliação da 1ª geração, com reduzida participação dos alunos no processo, existência separada das aprendizagens, num tempo específico e criado para o efeito (o dia do teste) e orienta-se por uma norma. É certo que se encontra polvilhada de outras funções, como a regulação do processo de ensino-aprendizagem, a seleção/orientação, ou a informação que fornece… mas predomina a noção de avaliação como medida. A vertente certificativa da avaliação ganha um peso social incomparável no contexto escolar e social e vai funcionar como imagem de (quase) toda a avaliação. (p. 9).
Em suma, a abordagem certificadora, centrada nos resultados escolares é dominante mas não exclusiva, compactando com a avaliação orientada para o estudo dos processos e avaliação centrada na ação vista como um todo (p. 18).
2ª ideia – Passar da avaliação das aprendizagens para a avaliação como e para as aprendizagens: mudar paradigmas e modelos pedagógicos e vencer resistências de atores escolares (professores, alunos, pais e encarregados de educação) e de outros
A avaliação interrelaciona-se com os modelos pedagógicos e desenvolve-se numa triangulação composta por professor, aluno e saber que atua como um jogo de forças, com 1 elemento ativo e 2 passivos, e uma relação privilegiada entre 2 dos 3 elementos que nos indica o processo estruturante dos diversos funcionamentos pedagógicos que podem ser três: (i) ensinar - que privilegia o eixo professor/saber e que dá ao aluno o lugar passivo – a avaliação sumativa; (ii) formar - que privilegia o eixo professor/aluno e torna o saber passivo – a avaliação formativa; (iii) aprender - que privilegia o eixo aluno/saber e toma o professor como passivo – a avaliação formadora. (p. 19).
Os dois primeiros eixos relacionam-se com a avaliação das aprendizagens. O 3º eixo desenvolve um enquadramento distinto: avaliação como e para as aprendizagens em que a avaliação desempenha neste processo um papel central no próprio processo de aprendizagem. Toda a aprendizagem comporta necessariamente dificuldades e erros. Sendo a avaliação o instrumento que revela os erros e ou dificuldades, pode através da compreensão da natureza deles próprios tornar-se num instrumento ao serviço das aprendizagens (p. 22). Para que os erros ou dificuldades possam ser ultrapassados é necessário que sejam reconhecidos e compreendidos não só pelo professor, mas fundamentalmente pelo próprio aluno. Neste sentido, os instrumentos de avaliação devem ajudar o aluno não só a reconhecer os seus pontos mais fracos, mas fundamentalmente a percebê-los e a ser capaz de encontrar meios para os ultrapassar através do seu próprio envolvimento.
Deste modo, a avaliação da aprendizagem é feita pelo aluno - autoavaliação regulada como aprendizagem - em redor dos critérios de avaliação, o que se torna uma prioridade de modo a criar as condições para que estes critérios apropriados – negociados ou não – pelo aluno funcionem como referencial da autoavaliação e como recursos para a aprendizagem para se encontrar o melhor caminho para superar as dificuldades e com a orientação e feedback do professor. (p. 23). (1)
Assim, a avaliação da aprendizagem transmuda para avaliação como e para as aprendizagens. Assumir este paradigma significará ultrapassar o dogma “o professor tem a faca e o queijo nas mãos” tão enraizado na nossa cultura escolar, vencer a cultura dominante do exame nacional como O Maior e Mais Confiável dos instrumentos de avaliação e exigirá, como Jorge Pinto refere, uma grande intencionalidade do professor e de comprometimento do aluno no seu processo de aprendizagem.
Talvez o Projeto MAIA seja (mais) um motor de mudança rumo à avaliação alternativa, em que o ensino, a aprendizagem e a avaliação constituem um ciclo articulado e coerente, em que a avaliação, através do processo de comunicação que se estabelece e, muito particularmente, através de um feedback deliberada e devidamente preparado e utilizado, «entra» no ciclo do ensino e da aprendizagem (Fernandes, s/d, p. 16).
Assim o creio.
(1) Neste momento, centenas de agrupamento de escolas a nível nacional participam no Projeto MAIA (monitorização, acompanhamento e investigação em avaliação pedagógica) procurando, por exemplo, rever os critérios de avaliação, transformando-os em documentos transversais a todo o agrupamento, independentemente do ciclo de ensino ou da disciplina, e inteligíveis por todos. Procuram criar rubricas de avaliação que permitem articular as aprendizagens com o ensino e a avaliação e clarificar o que se deve aprender e saber fazer. Este poderá ser um caminho.
Fernandes, D. (sd). A avaliação das aprendizagens: uma agenda, muitos desafios. Texto Editora.
Pinto, J. (no prelo). A Avaliação em Educação: da linearidade dos usos à complexidade das práticas, in L. Amante e I. Oliveira (Orgs.) Avaliação das Aprendizagens: perspetivas, contextos e práticas. E-book, Lisboa: Universidade Aberta.
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